A denominada “Carta de Porto Alegre”, documento oficial do CREMERS, entrará para a história do nosso país e será lembrada como um grande marco na transformação e reconhecimento da emergência como especialidade no Brasil.
Dentre as diretrizes e necessidades divulgadas pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul, destacam-se:
1) criação da Especialidade Medicina de Emergência, via Comissão Mista de Especialidades;
2) estimular a criação de Residências Médicas em Medicina de Emergência em todo o país;
3) qualificar e capacitar todos os médicos atuantes nas Emergências, através de Cursos, habilitando-os a concorrer ao título de Especialista em Medicina de Emergência;
4) incentivar a criação da Disciplina de Medicina de Emergência em todas as Escolas Médicas do país;
5) Implementar um Plano de Cargos e Salários, com remuneração justa e digna aos médicos emergencistas.
Mais uma vez, a Abramede entra em sintonia com entidades que de fato querem um Brasil melhor.
Texto: Dr. Herlon Saraiva Martins
Vice-Presidente da ABRAMEDE
Médico Assistente do Pronto-Socorro do HCFMUSP
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CARTA DE PORTO ALEGRE
A crise nas Emergências agrava-se a cada ano e hoje constitui um dos grandes problemas de saúde no Estado. Os enfermos que acorrem às Emergências aumentam progressivamente; em contrapartida, não há oferta de leitos hospitalares na mesma proporção, levando à inevitável superlotação e queda vertiginosa da assistência prestada aos pacientes, bem como ao desgaste dos profissionais médicos e profissionais da área da saúde destas Unidades.
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande de Sul – CREMERS -, na condição de ente que tem, como uma das atribuições legais, resguardar, na relação médico-paciente, uma medicina qualificada, segura e ética, é frequentemente provocado a fiscalizar e intervir, a fim de garantir a assistência adequada aos pacientes.
O CREMERS, preocupado com uma solução para a situação caótica das Emergências de Porto Alegre e do Estado, promoveu, em sua sede, o primeiro Fórum de Emergências, nos dias 25 e 26 de março de 2010. Participaram do evento Conselheiros, Delegados das Delegacias Seccionais do CREMERS (interior), médicos palestrantes de outros Estados, e médicos atuantes nas Emergências dos grandes hospitais de Porto Alegre e das cidades do Interior, juristas com experiência na área, representando o Ministério Público Estadual e o Poder Judiciário, com o apoio das entidades médicas CFM, AMB, FENAM, AMRIGS, SIMERS, Sociedade Brasileira de Pediatria, Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE), Secretaria Municipal de Saúde e SAMU.
CONSIDERANDO o direito constitucional do cidadão de acesso universal à saúde, previsto no artigo 196 da Carta Magna vigente;
CONSIDERANDO que é direito do médico exercer a atividade em condições dignas (inciso IV do capítulo II do Código de Ética Médica);
CONSIDERANDO a grave situação vivenciada pelas Emergências, superlotadas, com condições precárias de atendimento e dissociadas da rede de saúde;
CONSIDERANDO que todas as iniciativas para as soluções deste problema, adotadas nos diferentes níveis, mostraram-se ineficientes;
CONSIDERANDO o aprofundamento dos debates de importantes temas da área neste Fórum específico para a Crise das Emergências, mediante os quais se constatou:
- Dissociação entre emergências e hospitais
- Inoperância do sistema de referência e contrarreferências
- Financiamento insuficiente (custo do atendimento é maior do que o valor pago pelo SUS)
- Falta de leitos para acompanhamento após o atendimento na emergência
- Despreparo dos profissionais que atuam nas emergências
- Inexistência de central de leitos exclusiva para emergências
- Ineficiência dos serviços preparados para atender em Urgência e Emergência, em número compatível com a necessidade
- Falta de integração dos gestores nos diferentes níveis de Poder
- Ineficiência da rede básica no atendimento primário, determinando o encaminhamento aos serviços de Urgência e Emergência como forma de resolver o problema do paciente
- Insuficiência no fornecimento de medicamentos de doenças crônicas, gerando situações de emergências (por exemplo, falta de anti-hipertensivo, aumentando o número de AVCs)
- Remuneração desencorajante para atrair médicos especialistas em Urgências e Emergências
- Falta de plano de carreira no SUS
- Deficiência no sistema de comunicação entre os hospitais, a fim de permitir contato ágil e rápido entre o médico na ponta e o médico emergencista
- Desconhecimento global do sistema (quais são, onde estão, e a especialização de cada serviço)
- Inexistência de descentralização regionalizada dos serviços de emergência e urgência
- Fechamento de hospitais em Porto Alegre e no Estado, em número crescente.
CONSIDERANDO que a exposição do médico a condições inadequadas de trabalho contraria os princípios fundamentais definidos no Código de Ética Médica, dentre os quais o previsto no inciso II do capítulo I, segundo o qual “o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional”, o 1º Fórum de Emergências, realizado no CREMERS, propõe:
PROPOSIÇÕES
- identificar e hierarquizar todas as Emergências Gerais e Especializadas, mediante redes regionais de assistência a pacientes agudos, fazendo valer a referência, bem como a contrarreferência, do ponto de vista logístico, administrativo, assistencial e financeiro;
- implementar a Regionalização da Assistência à Saúde, segundo critérios técnicos, nos seus complexos primário, secundário e terciário, visando garantir a assistência para toda a população nas situações agudas;
- aumentar o número de leitos resolutivos de internação em hospitais de média e alta complexidade, em hospitais próprios do SUS e conveniados, para permitir a transferência de pacientes estáveis das áreas de emergência, a fim de melhorar a capacidade de atendimento dessas unidades;
- ampliar a rede básica, os respectivos horários de atendimento, assim como os investimentos em infra-estrutura, conferindo maior poder resolutivo para os casos de menor e média gravidade, permitindo a contratransferência e a redução da demanda nas Emergências;
- estabelecer um limite de pacientes graves sob os cuidados do médico emergencista, de acordo com critérios de gravidade;
- definir a capacidade máxima de atendimento de cada Serviço de Emergência, estabelecendo-se que, em situações de catástrofes, é admitido um incremento de até 20% da capacidade máxima, atribuindo-se a responsabilidade aos gestores, excedido o limite, de providenciar novos locais de atendimento;
- estabelecer e fazer cumprir um limite máximo de 24 horas para a permanência de um paciente no Serviço de Emergência;
- determinar que a Central Reguladora de Leitos assuma seu papel de gerenciar os leitos de emergência junto aos hospitais, responsabilizando-se pela agilização de transferência e contratransferência de pacientes, disponibilizando leitos hospitalares na rede pública e privada;
- orientar o Poder Judiciário a encaminhar as decisões judicias referentes a pedidos de internação em emergências e UTIs à Central Reguladora de Leitos, responsável pela gerência do setor de saúde, para que defina o local mais apropriado para cumprir a respectiva decisão;
- implementar uma rede de atendimento para os pacientes psiquiátricos, nos níveis primário, secundário e terciário, garantindo o adequado atendimento nas situações agudas;
- adotar uma estratificação de risco padrão, para todas as Emergências, de acordo com os critérios de gravidade (por exemplo, o modelo “Manchester”), visando o gerenciamento e o controle de qualidade;
- exigir que as Emergências implementem e apliquem protocolos e marcadores de qualidade, bem como métodos de gerenciamento;
- estimular a formação e fixação do médico no Serviço de Emergência, mediante:
1) criação da Especialidade Medicina de Emergência, via Comissão Mista de Especialidades;
2) estimular a criação de Residências Médicas em Medicina de Emergência em todo o país;
3) qualificar e capacitar todos os médicos atuantes nas Emergências, através de Cursos, habilitando-os a concorrer ao título de Especialista em Medicina de Emergência;
4) incentivar a criação da Disciplina de Medicina de Emergência em todas as Escolas Médicas do país;
5) Implementar um Plano de Cargos e Salários, com remuneração justa e digna aos médicos emergencistas.
Porto Alegre, 26 de março de 2010.